segunda-feira, 15 de abril de 2013

Autotransplante (...) II

Era quarta feira e a alvorada matinal continuava... era o dia do início da quimio. A rotina era sempre a mesma todos os dias. Depois de tudo feito, com o cateter a funcionar na perfeição, era hora de fazer quimio! Só me lembro de acabar muito rápido, nem sei demorou 1h. Pensava que desta vez ia passar mal, porque a quimio era mais forte do que aquela a que eu estava habituada e já estava preparada para isso.
Passado um bocado, comecei a sentir os dedos a incharem e quando me olhei ao espelho reparei que a cara também estava a ficar. Estava a ficar desconfortável, continuava a inchar... chamei o Pedro e ele é que me disse que estava a fazer retenção de líquidos. Fora isso, estava tudo bem... parecia uma criança a olhar para o penso do cateter, parecia que tinha um brinquedo novo. O Pedro era muito brincalhão, e arrastava com ele a enfermeira Paula... conclusão, as manhãs eram sempre uma animação. As visitas eram sempre as mesmas, mãe e avó ( às vezes o pai também) e alguns amigos porque era Verão e estava tudo de férias. Depois de jantar, a enfermeira Ana Teresa foi-me levar o comprimido que eu me recusava a tomar porque no dia a seguir ficava cheia de sono, e trouxe-me também a pílula, que ia começar a tomar para não ter menstruação. À noite não aguentava mais o inchaço, chamei a Filipa e pedi que me desse alguma coisa para aquele incómodo passar. A única solução era o lasix, que fazia com que eu fosse fazer xixi de 5 em 5 minutos... como era de noite, já sabia que ia passar a noite naquilo mas não me importava, desde que melhorasse. No dia seguinte já estava um bocadinho melhor mas ainda era incomodativo. Havia mais quimio para fazer antes de almoço. A Sandra passava lá para me dar um olá quando podia, já era mais um bocadinho de companhia. Na sexta feira tive direito a mais uma dose de quimio, e para meu espanto ainda não tinha sentido nenhum efeito secundário até ao momento. Mas nessa tarde, comecei a ficar com frio, estava a ficar com febre de certeza. A Telma veio-me dar a medicação necessária para passar, mas a febre voltou depois do efeito passar. Tinha de colher sangue, do cateter e de uma outra veia, porque podia ser uma infecção derivada ao cateter ou podia ser só da quimio ( há sempre o risco de infecção no cateter, mas claro que fui informada desses riscos). Entretanto a febre passou e o resultado das análises sairam, era só da quimio. No sábado fiquei a dormir até um pouco mais tarde, não haviam médicos a correr nos corredores nem a visitarem os doentes... só não havia folga para a quimio. Comecei a aperceber-me que estava no quarto ao lado do meu, um rapaz assim novo como eu, ouvia os enfermeiros a falarem com ele e a ele próprio a reclamar de o acordarem cedo. Apesar de estar naquele serviço, mantinha sempre contacto com as pessoas da pneumologia como as do serviço ao lado. Nesse dia tive umas visitas extra, a Vivi e a Sandra Gato da pneumo foram-me visitar. Oh, é claro que tinha saudades delas... foi com elas que estabeleci o primeiro contacto nesta caminhada pelo hospital e sentia-me feliz por saber que se importavam comigo e que se lembravam de mim, tal como eu delas. O inchaço começou a passar ao longo do dia, e consegui dormir confortável, caminhando assim para o dia do transplante.

Autotransplante (...)

Ligaram-me do hospital no dia 14 de Junho. Tinha de lá estar no dia 18 por volta das 13h... e assim foi, lá ia
eu de mala feita outra vez. Quando cheguei tive de ir fazer um raio x antes de ser internada, acho que era para eles terem uma referência qualquer do antes e do depois. Fiquei à espera até as 17h para ser internada ( o que até foi bom porque deu para comer comida da boa antes), e foi aí que o enfermeiro André me veio chamar. A minha mãe entrou comigo, para conhecer os meus novos aposentos... o quarto desta vez tinha uma bicicleta daquelas de fazer exercício, confesso que achei piada. Não me iam colocar o cateter central naquele dia, só no dia seguinte ( respirei de alívio, não gostava nada daquela ideia), mas como estava internada tinha de meter um acesso na mesma. Lá veio o André procurar uma veia que não se escondesse... picou uma mas eu avisei-o logo que aquela não ia dar ( eu, a profissional de veias), mas mesmo assim ele tentou embora depois conclui-se que eu estava certa. No dia seguinte o Dr.Raul colocava-me o cateter e na quarta começava a quimio antes do transplante que seria na semana seguinte. Aquele resto de dia passou rápido, quando reparei já era terça de manhã quando me acordaram por volta das 9h (era cedíssimo para mim) para mudarem os lençóis da cama, tomar o banho à gato ( acho que já sentia falta de um chuveiro e ainda nem um dia tinha passado) e tomar o pequeno almoço. A minha sorte é que estava quase carequinha, senão era um trabalhão para lavar o cabelo sem um chuveiro. Depois de tudo feito e ainda antes de almoço, o Dr. Raul chegou com o Pedro para fazerem a maldade. Lá veio a pica da anestesia local, e depois uma pica mais forte ( que era o cateter, a ponta daquilo parecia a ponta dos pauzinhos do chinês), doeu um bocadinho mais do que esperava mas suportava-se bem. Teve de voltar a fazer o mesmo porque o primeiro não ia na direcção certa e, de repente, comecei a sentir o coração a bater mais depressa, o que significava que já tinha encontrado a veia certa e pronto... 3 pontinhos e já estava. O que me passou semanas a atormentar estava concluído, e agora já não precisavam de andar à procura das minhas veias fugitivas. Ainda tive direito a ir dar um passeio até ao piso do raio x para fazer um, para terem a certeza que o cateter estava bem colocado ( como ainda não tinha começado o tratamento não havia problema em estar em contacto com outras pessoas). E como já era costume, não conseguia comer a comida de lá, só o cheiro me enjoava. Só o que ainda conseguia comer era a canja e o pão com manteiga. Tinha muita coisa com que me entreter, tinha a televisão, o computador, o quarto só para mim... era quase como se tivesse em casa. Um dos únicos inconvenientes era quando vinham colher sangue as 6h, mesmo que não fizessem barulho ao entrar, acordava sempre quando me destapavam para ficar com o cateter de maneira a que eles pudessem fazer a recolha.