sexta-feira, 21 de setembro de 2012

31º Dia

Era domingo, e supostamente o último domingo... A dor de cabeça é que não havia meio de ir embora. Segundo os médicos seria só uma semanita assim. A ideia de rapar o cabelo continuava na minha cabeça, continuava a cair imenso e até já notava peladas à frente. Não gostava nada daquilo assim... Nem sequer imaginei como ia ficar, se ia gostar. Estava mesmo decidida a fazê-lo no dia seguinte antes de ir para casa ( não ia encher a minha cama de cabelos). O formigueiro que me tinha aparecido há uns dias aumentou, parecia que não tinha sensibilidade na ponta dos dedos e consequentemente não tinha força. Os médicos diziam que era uma reacção a um medicamento da quimio, mas achavam que era um bocado cedo para isso. Mal conseguia escrever mensagens, tinha de fazer imensa força para carregar nas teclas e ainda por cima o meu padrinho tinha-me oferecido um telemóvel novo ao qual ainda não estava habituada. Falei com a Mary e ficou combinado que ela me levaria um lenço para meter na cabeça no dia seguinte ( achava sinceramente que ela se ia acabar por esquecer) e ia-me acordar. Andei a tirar fotos com a Cândida, queria ficar com uma recordação daqueles dias todos com ela. Ela pediu-me uma foto minha ( por acaso tinha uma tipo pass na carteira por causa da matrícula na faculdade), dei-lhe a foto e ela disse " Vou levá-la comigo para a minha terra"... Emocionou-me o carinho com que ela disse aquilo e logo de seguida ( ao que achei piada), meteu a foto dentro duma bolsinha impermeável onde guardava a escova de lavar os dentes e disse " vou guardá-la aqui para não se estragar". A minha mãe não achou muita piada à ideia de rapar o cabelo, quando estava de saída pediu-me " não rapes o teu cabelo ainda Ana". Mas nem isso demoveu a ideia da minha cabeça, era mesmo desconfortável estar a vê-lo cair. A Cândida sabia que eu ia ter alta no dia a seguir, mas eu estava sem apetite nenhum, então disse-me assim " Queres ir para a tua casa?" e eu respondi " Quero" e ela diz " Não queres não, para ires para casa tens de comer. Vês? Eu estou a comer, quero ir para casa". Levei mais duas ou três garfadas à boca, mas não conseguia mesmo comer mais. Estava a umas horas de ir para casa, mas não estava propriamente contente... Estava contente porque podia voltar a comer comidinha da boa e ter as minhas coisas, estar no meu quarto... Mas a ideia de deixar as enfermeiras, a Cândida, as auxiliares deixava-me com lágrimas nos olhos! E lá estava eu a chorar, mais uma vez não por ter um tumor, mas sim porque as ia deixar.

Sem comentários:

Enviar um comentário